sexta-feira, 7 de outubro de 2011

E a "Lei" da meia entrada? Como é afinal?


Nós humanos temos uma característica por vezes não muito civilizada de tirar as pessoas para “cristo”, sem saber de fato os caminho ou por onde as coisas andam saímos falando o que legitimamente é válido e por outras tantas vezes correto, porém em um momento não apropriado.
Quando saiu esta semana a aprovação do Estatuto da Juventude, onde está inserido a meia entrada para estudantes. De imediato liguei para a relatora do projeto, a Deputada Federal Manuela D’Ávila para saber de fato o que está acontecendo. Recebi a explicação que a lei foi aprovada, ou seja, aponta o direito do adolescente, agora entra em processo de regulamentação, que mostra como deve ser aplicada a lei, com benefício para todos os lados. Quando falo todos os lados, um deles é o do promotor de eventos que nunca paga meio valor em nada, inclusive nos impostos, tudo é sempre 100%. Fiz esse questionamento para a Deputada e ainda, questionando por que eu devo dar desconto para idoso, desconto para estudante, desconto e desconto se a empresa é 100% capital privado? De pronto ela respondeu que nesse momento entravam os promotores para o debate da regulamentação da lei. Entendi.
Antes de continuar, gostaria de “colar” aqui, um e-mail que disparei em 2008, sobre Leis de Incentivo a Cultura:
“Crise na Cultura
Demorou mas veio à tona.  Sempre fomos contra a grande maioria dos projetos da LIC, principalmente aos que traziam cultura incentivada ao publico gaúcho com cobrança de ingressos que ultrapassavam a faixa de preço dos R$ 100,00.
Ora, trabalhamos com isso há mais de 20 anos e sabemos, de antemão, sem necessidade de orçar item por item, quanto custa um evento e quanto deve ser cobrado de ingresso para atingir o lucro desejado. Por esta razão, podemos afirmar categoricamente, que não existe, hoje, nenhum show nacional que tenha ingressos ao valor médio de R$ 100,00 e necessite de incentivo fiscal. Isto quer dizer que na verdade o incentivo está pagando o risco da produtora e o ingresso passa a ser o seu lucro de 100% !
Projetos incentivados devem ser, salvo algumas  exceções, totalmente gratuitos, com o objetivo de levar lazer e entretenimento a todos. Quais são as exceções? As exceções devem ser àqueles projetos que apresentam alto risco financeiro e que possuam um apelo cultural histórico e fundamentado. Com certeza não estou falando aqui de shows de artistas como Caetano Veloso, Maria Bethânia, Ivete Sangalo, ou qualquer outro artista que tenha grande potencial de venda de ingresso.
A cultura deve ser incentivada para projetos que contemplem espetáculos com artistas pouco conhecidos do público do sul e cuja divulgação seja dispendiosa ou de efetivo risco aos seus produtores.
Quem faria por conta própria, assumindo todos os riscos, em anos passados o show do “Cordel do Fogo Encantado”, ou traria as manifestações artísticas do manguebeat de Chico Science, sem ter certeza de lucro? Sim, projetos como esses poderia estar contemplados por incentivos fiscais e nunca estiveram.
O incentivo deve consistir em levar a nossa cultura, regional ou até brasileira, para fora do país, mostrar o que é nosso aos outros, isso sim com o dinheiro que empresas privadas deixariam de pagar aos cofres públicos e colocariam em cofres de produtoras privadas com o objetivo de propagar a cultura desconhecida do país do samba.
Além disso, as falhas no planejamento da lei, permitem a alteração de atrações, sem precisar refazer o projeto. Isso abre portas para possíveis corrupções. É feito um projeto com base em dados de determinado evento/artista, após aprovado pode-se alterar a atração.
O que o cidadão comum não sabe, tampouco tem obrigação de saber, é que uma produção possui diferenças gigantescas de necessidades técnicas entre artistas de um mesmo padrão. Aqui está um dado importante: a necessidade que pode custar R$ 1.000,00 para um artista, pode custar R$ 10.000,00 para fazer o evento de outro artista de mesmo porte e reconhecimento. Como pode então num projeto ser alterado somente a atração, sem ser refeito o projeto na sua totalidade?
O que tenho a dizer é que isso, ainda, é apenas o início. Se houver força de vontade e os veículos de comunicação de nosso Estado ajudarem, muitas respostas para questionamentos como: perpetuações em cargos públicos de cultura, processos de licitações não tão claros assim e porque umas produtoras tem percentualmente mais projetos aprovados que outras, vão aparecer!”
Na época, esse e-mail correu a imprensa, foi noticiado e tudo mais. Pouca coisa foi feita. O texto foi limitado à LIC Estadual, porém sem dúvidas ele deve ser estendido para a Lei Federal. Resgatei esse e-mail, pois foi por aí que a conversa com a Deputada desenrolou.
Acredito que nenhum legislador quer fazer uma Lei para ser burlada, o que seria fácil com uma Lei dessas, mas quem pagaria a diferença seria o público que não recebe o benefício do desconto, já que um ingresso que custaria normalmente R$ 100,00 seria vendido de forma “inteira” por R$ 200,00, o que não seria justo com a Lei e com o público em geral, alias o que acontece em São Paulo e Rio de Janeiro há anos.
Então acredito que o caminho seja pelo verdadeiro incentivo à cultura, ou seja, um percentual da carga total de ingresso seja destinado aos descontos para estudantes e idosos, porém o desconto dado pelo promotor privado seria revertido em uma espécie de carta de crédito para incentivo cultural junto as verbas de marketing das empresas. Como fazer isso? Bom, aí acredito que os tantos deputados devem escutar quem de fato trabalha com isso e encontrarmos juntos um caminho sensato e real.
Pense nisso. Reflita. Opinie. Compartilhe.

Um comentário:

  1. Rodrigo, parabéns por trazer o assunto à discussão, precisamos muito disso, e o momento não poderia ser mais adequado.

    Como fica claro na sua abordagem, o grande financiador da meia-gratuidade, atualmente concedida de forma "gentil" pelo governo a estudantes e idosos, não é tanto o artista, nem o produtor, muito menos o próprio governo. Quem essencialmente banca a meia-entrada é a parcela do público não beneficiada, que se sujeita a pagar dobrado pela mesma atração. Entendo que a lei que concede essa benesse a estudantes e idosos é, atualmente, uma total ingerência do governo sobre um negócio privado, como você bem coloca, sem que nenhuma contrapartida ou compensação seja oferecida.

    Com a recente aprovação do "Estatuto da Juventude", onde está inserida a extensão do benefício a pessoas de 15 a 29 anos, estudantes ou não, acende-se uma luz amarela sinalizando o iminente agravamento do problema, sendo natural (e bom!) que a classe artística se manifeste. Mantida na sua regulamentação a fórmula atual do "salve-se quem puder", o que não será estranho se ocorrer, a nova lei criará uma faixa de "excluídos culturais" formada por pessoas de 30 a 59 anos, que, na prática, será banida dos eventos. A lei comete um equívoco, ao estabelecer no seu texto o percentual de gratuidade de 50%, quando a definição do valor deveria ter sido deixada para o momento de sua regulamentação. Seria, assim, possível incentivar os jovens com base na renúncia fiscal sobre o valor dos ingressos, o que representaria algo em torno de 20% de desconto. Ninguém sairia perdendo e o governo cumpriria seu papel de facilitar o acesso de estudantes, jovens e idosos aos espetáculos, o que é bastante justo. Da forma que a redação está, não vejo outro jeito de atingir o percentual estabelecido senão o governo subsidiando os 30% restantes. Aritmética simples de calcular e difícil de por em prática.

    Nos transportes, as gratuidades e meia-gratuidades são arcadas pelo governo, por que com a cultura não é assim? Por que sob o rótulo de estarem defendendo o acesso à cultura os políticos desferem golpes duros nas produções artísticas, contra produtores, artistas e principalmente o próprio público?

    Com todo respeito e admiração que nutro pela relatora Deputada Manuela d'Ávila, ou a regulamentação da "Lei da Juventude" garante os recursos públicos que irão bancar a gratuidade concedida, ou esta terá sido mais uma ação lamentável da Câmara Federal brasileira. Confesso que temo muito pela segunda hipótese.

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